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Alexandre Branco-Pereira

Porto Alegre cria mediadores interculturais para ajudar imigrantes no acesso à saúde


Projeto da Prefeitura quer ampliar e qualificar o atendimento de imigrantes na rede de saúde da Capital


Por Luciano Velleda para Sul21



A haitiana Youdeline é uma das mediadoras que facilitará o acesso às unidades de saúde, reduzindo a barreira linguística e cultural. Foto: Cristine Rochol/Prefeitura Municipal de Porto Alegre

A haitiana Youdeline Obas, de 36 anos, está empolgada com o desafio que tem pela frente. Há três anos morando em Porto Alegre, enfermeira de profissão, ela e dois colegas – outro haitiano e um senegalês – serão os responsáveis pelo início de um novo serviço de atendimento em Porto Alegre, o de mediadores interculturais da Secretaria Municipal de Saúde (SMS).

O objetivo do novo projeto, lançado semana passada, é facilitar o acesso dos imigrantes às unidades de saúde e hospitais, reduzindo a barreira linguística e cultural. Segundo a SMS, a Capital tem cerca de 30 mil imigrantes, considerando todas as situações migratórias, sendo a maioria de haitianos.

Youdeline explica que a primeira barreira para o imigrante no serviço de saúde é pensar se será ou não bem recebido, como vai ser atendido e ainda se vai ser entendido. “Essa é a primeira preocupação. Têm profissionais que não tem essa paciência… então o acolhimento é a primeira barreira.”

A enfermeira conta que o receio de ser ou não bem recebido persegue o imigrante em todas as etapas do serviço de saúde. Se vencida a primeira barreira no atendimento no posto de saúde, o sentimento segue na hora de realizar exames ou ir no hospital. Por isso, a possibilidade de auxiliar conterrâneos haitianos ou outros estrangeiros se apresenta como uma feliz oportunidade.

“Poder trabalhar na área da saúde em Porto Alegre, pra mim, é renovador. Nós imigrantes precisamos muito disso, fico contente, estou bastante motivada”, celebra.

Ela explica que a função os mediadores interculturais irá além da mera tradução do idioma, e visa identificar problemas e diferenças culturais existentes no atendimento de saúde. A expectativa é que o projeto traga bem-estar aos imigrantes no importante momento da consulta médica.

Também haitiano e há seis anos morando em Porto Alegre, o professor Jean Júnior atuava como mediador no Centro Vida quando viu o anúncio da Prefeitura sobre o novo projeto. Não pensou duas vezes.“

Pra mim, é uma honra fazer esse serviço junto com os profissionais de saúde para atender os haitianos. É uma felicidade. Aqui tem a barreira da língua, muitos não sabem nada. Me sinto grato em poder ajudar e colaborar com o projeto, é uma honra e uma felicidade muito grande”, afirma Júnior, enfatizando que os imigrantes realmente precisam desse apoio.


Qualificação


A empolgação dos novos mediadores interculturais contratados pela Prefeitura é semelhante a da técnica Rita Buttes, da área de Saúde do Imigrante da Atenção Primária. O departamento é recente, foi criado em 2018, devido ao aumento da migração ocorrida na Capital. Estudo feito pela área da SMS identificou que apenas 10% dos 30 mil estrangeiros em Porto Alegre têm cadastro no SUS e acessam a rede de atenção primária, “porta de entrada” do sistema de saúde. O baixo percentual foi determinante para a criação do novo projeto. “A gente vê que a população não acessa porque não conhece o SUS”, pondera Rita.

A figura do mediador, ela acredita, poderá mudar esse cenário. Afinal, são pessoas com acesso à comunidade, fluentes nos idiomas e identificadas com a importância do trabalho, incluindo a vacinação contra a covid-19.“São pessoas afinada com essa ideia de acesso ao SUS. E a barreira da língua precisa de um mediador intercultural que vai ‘decodificar’ todo um conceito de saúde, indo além da tradução, porque o que é problema aqui, na outra cultura pode não ser”, afirma.

Cada mediador terá um telefone celular e será chamado pelos postos de saúde quando houver agendamento de consulta com imigrantes, se deslocando então até o local. Em caso de atendimentos sem agendamento prévio, o auxílio poderá ser feito por meio de uma vídeo-chamada, como um primeiro apoio.

“Eles estarão disponíveis. Não basta ser só um tradutor, é preciso alguém que tenha a sensibilidade de explicar que no país dele (do paciente estrangeiro) as coisas podem ser diferentes”, explica a técnica da área de Saúde do Imigrante da Atenção Primária. Como exemplo, cita o uso de ferro e outras vitaminas receitado para gestantes no Brasil, e que não é procedimento padrão em outros países.

Rita acredita que o novo projeto pode também levar à qualificação dos profissionais de saúde de Porto Alegre, na medida em que ampliam o relacionamento com os imigrantes e aprendem a lidar com a diferença cultural.

A expectativa pelos resultados positivos é grande, como demonstra a enfermeira haitiana Youdeline: “Estamos botando a ‘mão na massa’ para que dê tudo certo. Esse projeto vai depender do nosso trabalho, do nosso esforço”.

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